Nossa entrevista nesse mês de abril foi com um jornalista muito renomado na área do meio ambiente, o jornalista André Trigueiro. André nos cedeu uma entrevista no qual nos dá uma aula sobre a questão da água no Brasil e no mundo.
- O nosso país está segregado economicamente entre seus estados. Na sua opinião qual é a região que devemos elevar os investimentos para que possamos obter um quadro mais promissor de segurança hídrica?
As bacias hidrográficas não estão separadas por regiões no país. Possuímos uma geografia da água que não respeita a delimitações dos estados, da geografia norte/sul. Quando falamos por exemplo do rio Paraíba do Sul, estamos falando de uma região que atravessa três estados. O Rio São Francisco a nascente é em Minas Gerais, região sudeste e ele vai avante até o Nordeste. Não separaria por região, mas diria que o bioma mais sensível que necessita de mais atenção neste momento é o cerrado brasileiro, que é a caixa d’água do Brasil, é o ponto de partida das principais bacias hidrográficas do país e é o bioma mais atacado, depredado, destruído, devastado, principalmente pelo agronegócio. Então um país que queira proteger as nascentes, os mananciais e os corpos d’água como o Brasil necessita fazer, deve rever a política de incentivo à produção agropecuária no cerrado.
- O senhor acredita que a população brasileira com um todo tem a consciência da escassez hídrica? Ou essa informação chega somente para as regiões mais desenvolvidas?
O medo da abundância em relação a água é falso porque a maior parte da água do país está na região norte onde vivem apenas 8% da população brasileira. E o grande aprendizado em relação ao uso da água vem da escassez do desabastecimento. Quatro anos atrás presenciamos o episódio do apagão hídrico em São Paulo por conta do volume morto do Cantareira. De lá para cá o consumo de água do paulistano caiu 20%, ou seja, ele aprendeu a usar a água com maior discernimento, aprendeu a valorizar esse recurso a partir de um cenário de escassez. Infelizmente o aprendizado mais efetivo se dá quando se falta água na torneira e percebemos como não é inteligente desperdiçar ou poluir os corpos hídricos.
- Você esteve no 8º Fórum Mundial da Água em Brasília? E o que você achou do evento?
Sim. Eu achei espetacular. Mais de cem mil pessoas passaram por Brasília, sendo um grande compartilhamento de ideias de projetos, de iniciativas, foi vitrine de países que tem gestão inteligente de recursos hídricos, como Israel, Austrália, Singapura e expos as mazelas do Brasil em relação ao desperdício, em relação a poluição, em relação a maneira como a agricultura consome 7 em cada 10 litros de água do Brasil em técnicas de irrigação ultrapassadas. Então o Fórum foi espetacular no ponto de vista da sensibilização, da demarcação na mídia em um espaço que se fez presente, lembrando as pessoas do risco, de um país campeão mundial de água doce a crise hídrica se agravar.
- Como o Brasil se destacou nesse Fórum? De uma maneira negativa ou positiva?
O Brasil está devendo. Não estamos em uma posição boa, temos o esgoto de cem milhões de pessoas, aproximadamente, lançados sem tratamento todos os dias nos rios córregos lagoas e no litoral. Quase cem milhões de brasileiros não tem os esgotos tratados. Quando falamos em agricultura a ineficiência é flagrante, o desperdício é monumental. Quando lembramos que esse país tem uma agricultura forte, esquecemos e o Fórum lembrou, que há o despejo monumental de resíduos de fertilizantes químicos e de agrotóxicos nos corpos d’água. A agricultura agrava a poluição dos rios também. Em relação ao garimpo ilegal, falamos em um despejo monumental de metais pesados, principalmente mercúrio, que é cancerígeno, em boa parte dos rios da região norte do país. O Brasil precisa declarar guerra a poluição e ao desperdício e se não o fizer, mais e melhor, vai pagar um preço caro.
- Isso a curto prazo?
Não… Isso já acontece. Brasília tem racionamento, o Nordeste enfrenta a pior estiagem em cem anos, São Paulo, como relatei anteriormente, há quatro anos atrás passou por uma situação difícil envolvendo o reservatório do Cantareira. Existem várias regiões do Brasil que já estão padecendo de situações pavorosas e o Fórum expos isso!
- O senhor acredita na atual educação ambiental em relação a economia da água? Ou a metodologia atual deve ser repensada?
Não sei… são muitas escolas publicas e privadas. Posso dizer que estamos melhor do que estivemos, pois na minha época não aprendíamos nada sobre esse assunto e hoje em dia a garotada já tem informação. Cada escola tem a sua dinâmica, sua didática, com bons exemplos nas escolas públicas e privadas. Então eu acredito que estamos melhores do que já estivemos.
André Trigueiro é jornalista com Pós-graduação em Gestão Ambiental pela COPPE/UFRJ onde leciona a disciplina “Geopolítica Ambiental”, professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC-Rio, autor dos livros “Cidades e Soluções – Como construir uma sociedade sustentável” (Ed. Leya, 2017); “Mundo Sustentável 2 – Novos Rumos para um Planeta em Crise” (Ed.Globo, 2012); “Mundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em transformação” (Ed.Globo, 2005), “Espiritismo e Ecologia” (Ed.FEB, 2009) e “Viver é a Melhor Opção – A prevenção do suicídio no Brasil e no Mundo” (Ed. Correio Fraterno, 2015); Coordenador editorial e um dos autores do livro “Meio Ambiente no século XXI” (Ed.Sextante, 2003). Durante 16 anos foi âncora e repórter do Jornal das Dez da Globo News. Desde abril de 2012, vem atuando como repórter da TV Globo. Durante 3 anos foi colunista do Jornal da Globo onde apresentou o quadro “Sustentável”, com séries especiais gravadas na China, na Alemanha, e várias partes do país. É editor-chefe do programa Cidades e Soluções, da Globo News, comentarista da Rádio CBN e colaborador voluntário das rádios espíritas Rio de Janeiro (RJ) e Boa Nova (SP).