Em um projeto pioneiro no Brasil, pesquisadores estão implantando microchips em tartarugas marinhas na reserva biológica do Atol das Rocas, a 267 quilômetros da costa do Rio Grande do Norte. O objetivo é aumentar e dinamizar o monitoramento do animal. O procedimento, indolor, foi iniciado em fevereiro passado e é considerado o mais seguro para as tartarugas, segundo os pesquisadores. Até o início de maio, mais de 100 tartarugas já tinham sido microchipadas.
A espécie escolhida pelo projeto é a tartaruga-verde (Chelonia mydas), ameaçada de extinção, segundo a International Union for Conservation of Nature IUCN (IUCN), e a mais frequente no Atol das Rocas. Essa espécie utiliza as ilhas oceânicas como áreas de desova. “Como no Atol não havia ninguém trabalhando com elas e são animais que ainda temos muito o que descobrir sobre a biologia e seu aspecto sanitário, resolvemos iniciar por lá“, explicou a médica veterinária Paula Baldassin, da BW Consultoria Veterinária e coordenadora do projeto. Ao longo do projeto estão previstos estudos sobre hematologia, taxa de crescimento, hormônios, parasitas e se há algum indício de contaminação por poluentes orgânicos, como, por exemplo, o petróleo.
Os microchips são implantados na nadadeira dianteira esquerda no momento em que as fêmeas ficam em “estado de transe“. “Isso ocorre durante 10 a 15 minutos, quando estão em postura de ovos. As tartarugas marinhas têm a característica de ficar em êxtase nesse momento. É quando aproveitamos para implantar o microchip e fazer as medições de carapaça das fêmeas“, disse Paula.
Antes, as tartarugas marinhas no Brasil eram marcadas apenas com anilhas metálicas. “Esse tipo de material pode se perder ao longo dos anos, deixando nos animais apenas cicatrizes e não os identificando corretamente. Já os microchips, que são utilizados com frequência internacionalmente, por serem introduzidos nos animais não são perdidos com facilidade. Eles permanecerão na tartaruga por muito tempo, necessitando apenas de uma só aplicação”, disse a pesquisadora.
Ainda segundo Paula Baldassin, outro objetivo do projeto é que as informações se tornem parte de estudos maiores. “Após a implantação do microchip, as tartarugas passam a ser monitoradas mais facilmente, utilizando-se apenas um leitor de chip para saber a origem do animal e coletar outros dados. Com isso, trabalhos científicos poderão ser facilmente elaborados. Além disso, todas as numerações dos microchips estarão à disposição em um banco de dados internacional com livre acesso.”
O projeto é realizado sob a licença do Sistema de Autorização e Informação em Biodiversidade (Sisbio), tem patrocínio da iGUi piscinas e da Gorski integradora e nessa primeira etapa será estendido até junho, quando termina o período de desova das tartarugas-verdes no Atol das Rocas. As “tartarugadas”, como os pesquisadores batizaram as madrugadas em que ficam acordados esperando a chegada e partida de tartarugas-verdes para desovar, são feitas por duplas.
A bióloga paulista Luciana Filippos trabalha em uma empresa de soluções energéticas em São Paulo e entrou no projeto como voluntária para ajudar na implantação de microchips em tartarugas. “Vim como voluntária apenas para ajudar nesse trabalho pioneiro. É um orgulho poder participar desse projeto, que deverá se tornar referência no monitoramento de tartarugas no Brasil”, afirmou.
Para a ecóloga potiguar Natália Roos, o projeto é um desafio e servirá como aprendizado. “O desafio é passar um mês longe de casa, com algumas privações e tendo que cumprir a rotina diária de monitorar as tartarugas. Mas o aprendizado é enorme e isso será fundamental para minha carreira.”
Para a chefe da reserva biológica, Maurizélia de Brito Silva, “este trabalho facilita e muito o monitoramento das tartarugas, pois com o microchip precisamos somente passar o leitor para saber as informações dos animais. Agora, não precisamos manipulá-las com frequência. Não havia pesquisas envolvendo a saúde desses animais, por isso convidei a Paula para essa parceria”.
De acordo com Paula Baldassin, das mais de 100 tartarugas que já tiveram microchips implantados, 73 já tinham retornado para uma segunda desova no Atol das Rocas até o início deste mês. “Essa espécie, costumeiramente, faz entre três e quatro desovas por ano. A primeira temporada está no final. Ideias surgiram, experiências foram trocadas, as tartarugas foram microchipadas e, embora a distância, os ventos e chuvas contribuíram para aumentar a vontade de seguir em frente. Ainda estamos no começo, mas sem dúvida acreditamos que estamos no rumo certo para a preservação e conservação desta espécie.”
Tartarugas-verdes
Essa espécie de tartaruga marinha está ameaçada de extinção. No período reprodutivo, a cópula ocorre no mar e apenas as fêmeas sobem à praia para desovar. Após escolherem o local adequado e fazerem o ninho, elas depositam cerca de 120 ovos por vez. Esses ovos possuem período de incubação na areia de cerca de 60 dias.
Como os pais não estão presentes para auxiliar no nascimento dos filhotes, eles têm que fazer isso por conta própria. A independência já começa na saída do ovo, onde eles utilizam um “dente” temporário chamado carúncula, que fica na extremidade da mandíbula, para quebrar a casca. Uma vez na superfície, esses animais se guiam pela claridade do horizonte para chegarem ao mar. Os filhotes têm que fazer isso o quanto antes para não morrerem ressecados pelo sol. Após o primeiro desafio de sair do ninho, outro maior vem em seguida: o ataque de predadores em terra, como caranguejos e aves.
Ao entrarem na água, os filhotes nadam por quilômetros até chegar ao alto-mar, local em que passarão seus primeiros anos de vida flutuando em meio a bancos de algas, e onde encontrarão alimento e abrigo. Já no mar, os predadores das tartaruguinhas são tubarões, peixes e aves. Além disso, elas também podem morrer ao ingerir plástico. Por todas as dificuldades enfrentadas, estima-se que apenas um em cada mil filhotes chegarão à idade adulta.
Fonte: Portal G1
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